O marco dos jogos episódicos na indústria dos videogames

Na última década, o mercado de videogames estava em uma constante de lançamentos de jogos em formatos episódicos. Nesse modelo, em vez de disponibilizar o jogo completo de uma só vez, as desenvolvedoras dividem a história em capítulos, lançados ao longo do tempo. Porém, atualmente, ainda é possível encontrar jogos com esse formato de distribuição, como é o caso do Deltarune, sequência do clássico indie Undertale, criado por Toby Fox. O jogo teve seus primeiros capítulos lançados gratuitamente, com as partes seguintes sendo vendidas em pacotes para que o jogador avance na história.

Ver Toby utilizar essa tática causou surpresa em parte do público, já que o lançamento episódico é mais comum em jogos focados em narrativa e escolhas, como os produzidos pela Telltale. No entanto, esse modelo vai além desse estilo, já que ao longo dos anos, ele também foi aplicado em diferentes gêneros, como em RPGs .

O modelo de narrativa dividida em partes

Os jogos que optam pelo lançamento em formato episódico passam por um planejamento prévio da desenvolvedora, que os divide em partes — ou seja, a trama principal se desenrola ao longo de diversos capítulos até sua conclusão. Essa estratégia envolve não apenas a divisão do conteúdo, mas também a forma de distribuição: Ao adquirir um jogo desse tipo ainda em andamento, o jogador não tem acesso imediato à história completa e precisa aguardar o lançamento dos próximos episódios.

Outra estratégia comum nesse modelo, especialmente em jogos com foco narrativo, é de oferecer os primeiros capítulos de forma gratuita e cobrar pelos seguintes conforme são lançados. Isso desperta a curiosidade de novos jogadores e aumenta as chances de que eles comprem o restante da história, o que funciona de maneira semelhante a uma "demo", muito comum no mundo dos videogames.

A origem desse formato

O primeiro jogo episódico lançado, veio muito antes da popularização dos videogames. Lançado em 1979 para o computador TRS-80, Temple of Apshai era um RPG Dungeon Crawler que teve diversos mini episódios lançados no mesmo ano de seu lançamento e que se passavam no mesmo universo. Isso o consolidou como pioneiro, não apenas deste estilo de distribuição, mas dos RPGs em si.

A forma de lançamento episódico popularizada atualmente, veio apenas em 2005, após anos de fracassos de outras empresas com o mesmo método. O jogo em questão é Bone: Out from Boneville, desenvolvido pela Telltale, empresa essa que impulsionou a popularização desse formato de lançamento na década de 2010. Seu maior sucesso veio com o jogo narrativo The Walking Dead, lançado em 2012, que conquistou o prêmio de Jogo do Ano (Game of the Year) naquela edição.

Após isso, diversos jogos se inspiraram nesse modo de lançamento, como o clássico narrativo Life is Strange. Outros gêneros completamente distintos também utilizaram desse formato, como foi o caso de Resident Evil Revelations 2, que manteve o estilo e gameplay de outros da mesma série, mesmo com a distribuição diferenciada. Mas outros títulos não tiveram a mesma sorte, como foi o caso do Half-Life 2, que teve seu início com o Episode One lançado em 2006, seguido do Episode Two lançado em 2007, infelizmente a terceira parte nunca viu a luz do dia, e acabou sendo cancelada em meados de 2010.

Vantagens e Desvantagens

Entre as vantagens desse modelo de distribuição, a estratégia de "demo" – com primeiros capítulos gratuitos, é um dos grandes diferenciais que mais atrai jogadores. Outro benefício é o engajamento contínuo gerado pelo lançamento gradual dos episódios, que mantém o jogo em alta com discussões, teorias e a expectativa pelo próximo capítulo que é reforçada por cliffhangers que são muito utilizados ao final de cada parte. Além disso, essa forma reduz os riscos para as desenvolvedoras, pois, se os capítulos iniciais não se saírem bem, a empresa pode interromper a produção para evitar perdas futuras ou usar o feedback dos fãs para aprimorar o jogo.

Entre as desvantagens, a quebra de ritmo é um dos principais problemas, que está atrelado ao ponto anterior sobre engajamento. Diferentemente de séries que sempre dividiram episódios, os fãs de videogames estão acostumados a comprar o jogo completo, o que pode gerar frustração ao se depararem com uma história fragmentada ao longo do tempo. Além disso, intervalos longos entre os capítulos podem fazer com que os jogadores percam o interesse. Por isso, é fundamental manter um equilíbrio na frequência de lançamentos, pois mesmo que seja para trazer uma experiência melhor ao público, a demora deixa qualquer um impaciente.

Por conta da demora entre um capítulo e outro, os fãs geralmente sempre esperam que a próxima parte esteja mais refinada, aumentando assim a expectativa -- que nem sempre é atendida, o que gera uma pressão dentro da desenvolvedora. Por fim, esse formato pode criar uma ilusão que você saia pagando menos no final, através de pequenos episódios baratos, mas que em sua totalidade, podem sair ainda mais caros do que um jogo completo não é dividido.

Embora hoje seja menos comum ver jogos lançados nesse formato, especialmente fora do nicho narrativo, alguns desenvolvedores ainda apostam na ideia e conseguem surpreender o público — como foi o caso de Deltarune. Mesmo com menor frequência, é inegável o impacto que o modelo episódico teve não apenas na forma de distribuir jogos, mas também na popularização dos títulos com foco em narrativa.