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Atentados no Nepal e assassinato nos EUA reacendem debates sobre violência política

De assassinatos a atentados, a escalada da intolerância mostra que a política deixou de ser apenas disputa de ideias para se tornar um campo de risco extremo

Imagem: Creative Commons
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  • O cenário político atual é marcado por violência e intolerância, refletindo uma realidade distópica.
  • A The Solutions Newsletter, liderada por Robert Viney, busca oferecer soluções para reduzir a divisão política.
  • Recentes episódios de violência política incluem protestos no Nepal e assassinatos de figuras públicas em diversos países, incluindo o Brasil.
  • Viney argumenta que a retórica agressiva é um sintoma da violência política, que está enraizada nas estruturas de poder e na falta de colaboração democrática.
  • A democracia se enfraquece quando apenas a maioria é ouvida, e a oposição é essencial para garantir o equilíbrio de forças e evitar o autoritarismo.

Se alguém rodasse hoje o noticiário de *breaking news* em uma sala de cinema, a impressão seria de estar diante de um filme de distopia ou ficção científica. Um enredo apocalíptico digno de produções como *Mad Max, Divergente, Guerra Mundial Z ou Maze Runner*. A diferença é que, desta vez, não se trata de *Hollywood,* mas da realidade.

Oitenta anos após o fim da Segunda Guerra Mundial , conflito que deveria ter ensinado a humanidade sobre os custos da intolerância e do extremismo, a política volta a se transformar em um campo de risco extremo, onde divergências ideológicas já não se limitam ao debate, mas passam a custar vidas.

É nesse contexto que surge a The Solutions Newsletter, criada há pouco mais de um ano com o propósito de oferecer “bom senso e soluções imparciais” para reduzir a divisão na política e aumentar a eficácia da governança. À frente dela está Robert Viney, ex-oficial da Marinha dos Estados Unidos, veterano da Guerra Fria e do Vietnã, hoje professor e consultor em liderança. Na quinta-feira (11), logo após o assassinato do ativista conservador Charlie Kirk, Viney publicou um artigo que buscou deslocar a discussão sobre violência política para além das explicações simplistas — como “culpa da esquerda” ou “morreu pelo que defendia”. Para o autor, a morte de Kirk não é um episódio isolado, mas o reflexo de um problema estrutural que vem sendo alimentado há décadas.

**Guerra** política, literalmente

Protestos violentos no Nepal, a morte da esposa de um primeiro-ministro em um incêndio e, mais recentemente, o atentado contra um ativista conservador nos Estados Unidos. Essas foram algumas das notícias que tomaram as manchetes na última semana.

Apesar de se tratarem de eventos internacionais, o Brasil não está fora desse mapa. Por aqui, fomos marcados pelo assassinato de Marielle Franco, vereadora e ativista dos direitos humanos, executada a tiros em março de 2018. Do outro lado do espectro político, houve o atentado contra o então candidato à presidência, Jair Bolsonaro, esfaqueado em setembro do mesmo ano durante um ato de campanha.

Quatro anos depois, em julho de 2022, o mundo acompanhou o assassinato de Shinzo Abe, ex-primeiro-ministro do Japão, baleado em plena rua durante um discurso. E nos Estados Unidos, há apenas três meses, a deputada democrata Melissa Hortman foi morta dentro de sua própria casa.

Esses episódios, embora distintos em contexto e geografia, ajudam a compor um quadro mais amplo, analisado por Robert Viney em seu artigo.

Sintoma X Causa

O assassinato de Charlie Kirk expôs uma ferida aberta e fez ecoar uma pergunta incômoda, repetida por repórteres, comentaristas e cidadãos comuns: *“Como podemos parar a violência política?”*

As primeiras respostas que surgem são quase automáticas: é preciso reduzir o tom da retórica, aprender a discordar de forma civilizada, enviar pensamentos e orações às famílias das vítimas. São frases corretas, mas insuficientes.

Como alerta Viney, essas medidas soam bem em discursos oficiais e editoriais de ocasião, mas funcionam apenas como curativos sobre uma ferida profunda. A retórica agressiva, por mais alarmante que seja, não é a causa central da violência, é um sintoma. O problema vai além das palavras: está enraizado nas próprias estruturas de poder e nos processos de governança que, ao longo das últimas décadas, se tornaram cada vez mais distantes da ideia de colaboração democrática.

O buraco é mais embaixo

A violência política é alimentada por um cenário que se consolidou ao longo dos anos, no qual partidos passaram a disputar não apenas eleições, mas o controle irrestrito do poder. No artigo, Viney fala especificamente dos Estados Unidos, mas a mesma lógica pode ser facilmente aplicada ao Brasil ou a outros países: adversários políticos deixaram de ser vistos como concorrentes legítimos para serem retratados como “inimigos”.

As acusações ganharam contornos de guerra cultural. Um lado é tachado de “socialista” ou “comunista”; o outro, em contrapartida, de “autoritário” ou “ditador”. A disputa deixou de girar em torno de políticas públicas específicas e passou a ser uma batalha existencial, em que perder uma eleição equivale, para muitos, a assistir à destruição da própria democracia.

Nesse processo, os representantes deixam de refletir o interesse comum, e os grandes problemas que atingem a maioria permanecem sem solução. O resultado é uma sensação de abandono: milhões de cidadãos não se sentem representados nem contemplados por políticas que poderiam melhorar suas vidas.

A maioria não é o todo

Quando apenas a maioria é ouvida, a democracia se enfraquece. A oposição é parte vital do sistema: garante o equilíbrio de forças, fiscaliza o governo e impede a concentração de poder, reduzindo os riscos de autoritarismo.

  • Oligarquia: modelo em que o poder fica nas mãos de um pequeno grupo que age em benefício próprio, ignorando os interesses coletivos.
  • Ditadura: regime em que o poder se concentra em um único indivíduo ou grupo restrito, restringindo direitos políticos e liberdades da população.

Robert Viney lembra que essa lógica autoritária já é visível em regimes atuais. A China e a Rússia são exemplos de países em que um partido único concentra o poder e dita os rumos da sociedade. Da mesma forma, muitas teocracias no Oriente Médio funcionam sob uma visão única, que não abre espaço para dissenso ou diversidade política.

Quando esse padrão se aproxima das democracias, as consequências são claras: discussões baseadas em fatos cedem lugar a acusações infundadas, e o debate público passa a girar em torno da demonização do adversário. Votar deixa de ser sobre propostas ou soluções e torna-se uma questão de identidade partidária. Um ato de fidelidade ao grupo ao qual cada eleitor sente que pertence.

O voto como identidade, não escolha

A história brasileira é repleta de líderes que conquistaram o povo pela via da passionalidade. Políticos que se consolidaram menos por programas estruturados e mais por discursos inflamados, promessas grandiosas e a criação de inimigos invisíveis.

Um dos exemplos mais citados por historiadores é o de Getúlio Vargas. Ele chegou ao poder em 1930 por meio de um golpe, com a promessa de romper com a oligarquia da Primeira República. Sua força não estava apenas nas reformas que de fato promoveu, mas no imaginário popular que construiu ao redor de si.

Esse fenômeno, porém, não ficou no passado. Nos dias de hoje, ganhou uma nova dimensão com a internet e as redes sociais. O ambiente digital ampliou o alcance das narrativas políticas e transformou líderes em figuras pop, capazes de despertar devoção quase religiosa em seus seguidores.

Onde foi que erramos?

Se no passado a humanidade jurou que lembraria os horrores das guerras e das ditaduras, hoje essa promessa parece ter sido esquecida. Viney finaliza o texto apontando saídas para o cenário americano, mas seu alerta é universal: a democracia, quando não cuidada, pode ser corroída de dentro para fora. A pergunta que fica é: quanto sangue ainda precisará ser derramado até que a política volte a ser o espaço do debate e não da eliminação?

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