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Brasil: Protagonista climático ou vilão da Amazônia?

O dilema entre exploração de petróleo na Amazônia e compromisso com a sustentabilidade, em meio aos preparativos para a COP30.

Logo da COP30 que acontecerá em Bélem. (Foto: Reprodução)

Logo da COP30 que acontecerá em Bélem. (Foto: Reprodução)

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Às vésperas da COP30, que será realizada em Belém (PA) em novembro de 2025, o Brasil vive um impasse que pode comprometer sua autoridade moral no debate climático global. Enquanto se apresenta como líder na transição verde e na proteção ambiental, o governo federal, por meio da Petrobras, avança com planos para explorar petróleo na bacia da Foz do Amazonas — uma das regiões mais sensíveis do planeta do ponto de vista socioambiental.

Belém: palco da COP30 e símbolo de contradições

A Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima acontecerá pela primeira vez na Amazônia. A escolha de Belém como sede foi celebrada como um gesto simbólico de protagonismo climático do Brasil e uma oportunidade para dar visibilidade às populações amazônicas.

Entretanto, à medida que os preparativos avançam, surgem críticas de ambientalistas e cientistas que apontam para um descompasso entre o discurso e a prática. A construção de obras viárias, como a Avenida Liberdade, já resultou em desmatamento na região. E, paralelamente, avança em silêncio o projeto da Petrobras para perfuração de poço de petróleo a 159 km da costa do Oiapoque (AP), em área ainda pouco estudada da chamada Margem Equatorial.

O que está em jogo?

Os principais temas que estarão em pauta na COP30 — redução das emissões de gases de efeito estufa, financiamento climático para países em desenvolvimento, tecnologias de energia renovável, adaptação às mudanças do clima, preservação de florestas e justiça climática — estão em clara contradição com a abertura de uma nova fronteira petrolífera na Amazônia.

Explorar petróleo numa região como essa coloca o país em posição ambígua: de um lado, pede mais recursos para conter o desmatamento e promover energia limpa; de outro, aposta em uma fonte fóssil sabidamente danosa, cuja exploração pode causar danos irreversíveis à biodiversidade e à vida das populações locais.

Riscos ambientais e sociais

A Bacia Amazônica abriga uma biodiversidade única. Seus mangues, corais e espécies raras de fauna e flora dificilmente se recuperariam de um derramamento de óleo. A própria Petrobras já enfrentou problemas na região: há 11 anos, um navio-sonda foi arrastado ao tentar uma perfuração, evidenciando os desafios logísticos locais.

Além disso, comunidades indígenas, ribeirinhas e pesqueiras dependem da biodiversidade marinha e fluvial para sobreviver. Um acidente ali comprometeria a subsistência de milhares de pessoas, ampliando desigualdades e aprofundando injustiças ambientais — em total desacordo com os princípios de justiça climática defendidos pela própria COP.

Falta de estudos e pressão política

Os pareceres técnicos do Ibama são claros ao afirmar que a ausência de uma Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) torna inviável uma decisão segura. Ainda assim, a Petrobras tem pressionado por licenças. O licenciamento do bloco 59 pode ser o estopim para uma série de autorizações em efeito cascata, que consolidaria a Margem Equatorial como nova fronteira do petróleo — e não da energia limpa.

Enquanto isso, o Ministério do Meio Ambiente, liderado por Marina Silva, e o Ibama têm se posicionado com cautela, em meio a um claro embate político dentro do próprio governo.

Transição energética ou dependência fóssil?

O governo Lula promete usar os recursos do petróleo para financiar a transição energética. Mas especialistas alertam que seguir investindo em combustíveis fósseis é uma estratégia de risco: além de atrasar o desenvolvimento de fontes limpas como eólica, solar, biomassa e hidrogênio verde, compromete a imagem do Brasil internacionalmente.

Suely Araújo, ex-presidente do Ibama, critica a escolha de áreas ecologicamente frágeis em entrevista com Claudia Antunes para a plataforma SUMAÚMA: “A Petrobras deveria usar as áreas que já estão abertas, e não ficar investindo em novas explorações em regiões únicas e mal estudadas como a foz do Amazonas”.

A falsa urgência da Petrobras

A alegação da Petrobras de que o Brasil precisará importar petróleo em dez anos caso não explore a Foz do Amazonas não se sustenta diante das metas climáticas assumidas pelo próprio país. Segundo análise da InfoAmazonia, baseada em dados da Agência Nacional de Petróleo e da Agência Internacional de Energia, se o Brasil cumprir seu compromisso de neutralizar as emissões até 2050, as reservas já descobertas garantem o abastecimento até pelo menos 2042.

O cientista Anton Schwyter, do Instituto Internacional Arayara, afirma em uma reportagem da InfoAmazonia: “A abertura da Foz do Amazonas só é necessária se o plano for não cumprir nenhuma meta de redução de emissões”.

Além disso, o investimento em petróleo pode representar um risco econômico: um estudo da UK Sustainable Investment and Finance Association aponta que o Brasil está entre os países mais expostos a perdas com a desvalorização de ativos fósseis até 2040 — estimadas em US$ 2,3 trilhões globalmente. Para o Brasil, quase metade desse prejuízo recairia sobre o setor público.

Qual Brasil estará na COP30?

O Brasil chegou ao centro do debate climático com promessas ousadas de conter o desmatamento e liderar a transição verde. Mas o caminho que escolher agora — entre investir em petróleo ou em fontes renováveis — definirá seu real papel na luta contra a crise do clima.

A contradição entre discurso e prática não passará despercebida aos olhos do mundo. A COP30 será tanto uma vitrine quanto um tribunal. E a Amazônia, mais uma vez, será o palco onde o futuro do planeta e a coerência de um país estarão em jogo.

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